terça-feira, 16 de junho de 2015

Meus treinos em Paris

Desde que deixei Paris em Março deste ano eu tenho pensado em escrever um texto sobre minha experiência. Treinar com os pioneiros da prática que eu amo tanto e que moldou minha vida é sem duvida uma das minhas maiores realizações e que com certeza eu me orgulho muito.

Eu tenho tudo guardado num canto da minha mente, uma biblioteca sobre tudo o que aprendi e uma imagem de todos eles bem guardados, mas por alguma razão eu ainda não tinha conseguido expor isto tudo em palavras. 

Foi só depois de ler o texto da Tatiana (RJ) que eu finalmente resolvi me esforçar para escreve-lo, mesmo sabendo que seria impossível transmitir tudo o que eu vivenciei.

Treinei com praticamente todos os membros do Yamakasi. Em Paris eu participei das aulas da ADD Academy durante todo o mês de fevereiro, sendo que uma vez por semana o Chau Belle era quem dava as aulas.

Tive a sorte de treinar duas vezes com o Yann Hnautra em Evry e cerca de duas semanas eu treinei com o Laurent Piemontesi, que atualmente é o representante da ADD em Milão, na Itália.

E para finalizar, treinei com o William Belle, que não dá aulas mas acabei conhecendo-o através de uma amiga. Este texto é um humilde (humilde mesmo!) relato dos meus treinos... Tentei ser o mais claro e honesto possível... Talvez algumas pessoas se sintam ofendidas, e eu sinceramente adianto minhas desculpas, pois ofender nunca é minha intenção. 

Chau Belle

O Chau Belle é o tipo de cara que vai te falar sem rodeios o que você está fazendo errado e o que precisa melhorar. Ele leva todos os treinos com muita seriedade e disciplina.

Ele lidera os treinos da ADD Academy pelo menos uma vez por semana, e treina com os outros instrutores com bastante frequência.

Tive o prazer de participar num desses treinos duas vezes. O primeiro foi bem técnico e ele me corrigiu um milhão de vezes. O segundo foi puramente físico e foi muito puxado... Tivemos que subir e descer uma escada de quadrupedal várias vezes e em diferentes variações.

O treino dele geralmente é bem puxado fisicamente e mentalmente, pois ele sempre passa vários exercícios de condicionamento no início para só no final do treino, quando você já está moído, treinar técnica. 

Desnecessário dizer que ele é forte pra caralho. Conheço poucas pessoas da idade dele (38 anos se não me engano) que aguentariam aquele nível de treino. Para minha surpresa ele também tem bastante fluência nos movimentos, principalmente em precisões e monkey precisions. 

Yann Hnautra

Só me vem na mente uma palavra pra descrever o Yann: brutalidade.

A primeira vez que eu vi ele foi bem engraçado. Eu estava voltando sozinho de Lisses e resolvi passar pela catedral de Evry só para fazer uns movimentos finais e, assim que entro, vejo o Yann alongando debaixo da chuva.

Foi um momento bem mágico para mim. Ver o cara que foi sempre um exemplo de força ali, se preparando para treinar sozinho! 

Neste dia tomamos um café ali perto e vim a descobrir que ele tem 42 anos e que toca violão muito bem. Conversarmos um pouco e o acompanhei no treino. Infelizmente o inglês dele não é muito bom e não deu para perguntar tudo o que eu queria saber... Espero que da próxima vez meu francês esteja bom o suficiente para conversarmos mais. 

A segunda vez que treinei com ele foi novamente na Catedral, mas desta vez tinha uma galera junta. Ele passou vários exercícios legais e a parte física foi bastante puxada... Se não me engano o treino durou quase 3 horas sem parar com ele puxando cada vez mais.

Ele não dá mais aulas regulamente e portanto treina quase sempre sozinho em Evry, o que me vez admira-lo ainda mais. O cara tem 42 anos e treina sozinho, sem seguidores, cameras ou platéia.

Laurent Piemontesi

Por pura sorte do destino eu tive a sorte de treinar duas semanas em Milão com um dos caras mais fortes que eu já vi na vida.

Laurent é do tipo calado, que não conversa se você não conversar com ele. Talvez por culpa minha, que também sou assim, não conversarmos muito. Mas com certeza ele é uma das pessoas no Parkour (ou l'art du deplacement, como preferem chamar) que mais treinam,

Como ele vive disso, treina pelo menos três vezes por dia, além das aulas que dá todas as noites. Além da força descomunal que se vê em seus vídeos, possui muita fluência e todos os seus movimentos tem um toque de sua criatividade.

Ele foca muito no controle ao invés da explosão do movimento. É bem atencioso com todos os alunos e brincalhão com os mais íntimos. 

Como disse, não conversamos muitos então não sei o que ele pensa ou quais são seus planos. Mas o tempo que eu passei em Milão foi ótimo por vários outros motivos, então tenho uma ótima lembrança de lá e sou grato as pessoas que me convidaram a ir para lá.

William Belle

O cara mais completo fisicamente e emocionalmente que eu já conheci na vida. O William possui uma calma muito no estilo oriental e ao mesmo tempo é muito brincalhão.

Apesar de não falar inglês, sempre foi muito atencioso comigo. De todos os outros membros do Yamakasi, é de longe o mais comunicativo e disposto a conhecer novas pessoas. 

Apesar de não treinar Parkour com tanta frequência hoje em dia, sua movimentação ainda é ótima. Ele ainda escala (é extremamente forte), dança e pratica uma arte marcial que eu não lembro o nome. 

Não quero puxar saco demasiadamente aqui (gosto de fazer isso pessoalmente :P), mas ele é o atleta mais completo de todos. Não se prende a uma arte ou filosofia especifica, está sempre experimentando coisas novas e é super esforçado para aprender. 

Meus amigos de Paris

Ok, todos essas pessoas são ótimas e foi fantástico conhece-las. Mas sendo bem sincero? Eu não voltaria em Paris só para treinar com eles. 

Meu tempo em Paris tinha tudo para ser uma merda. Eu estava sem lugar para ficar, doente e desapontado com a dificuldade de treinar com os Yamakasi, até eu encontrar uma pessoa maravilhosa que me ajudou muito.

Não foi expor o nome dela aqui por que não sei se ela gostaria, mas tenho certeza que ela sabe que estou falando dela!

Em toda minha viagem eu aprendi bastante, mas sem duvida a maior lição de todas eu tirei desse tempo que passei em Paris.

Aprendi que nome, no final das contas, não quer dizer porra nenhuma. As pessoas com quem eu mais me diverti e que estão nas minhas melhores memórias não são as mais famosas, mas sim aquelas pessoas tímidas e humildade que geralmente não dão entrevista nem fazem workshops para centenas de pessoas, mas são aquelas pessoas que mais estão dispostas a ajudar os outros, sem esperar nenhuma recompensa em troca. 

Sou extremamente grato a todas as pessoas que fizeram meu tempo em Paris ser tão rico. Não quero citar nomes, mas vocês sabem que estou falando de vocês :)

Quero registrar aqui também que quem move e sustenta o Parkour não são os caras habilidosos que você vê no YouTube, mas sim pessoas que se dispõem a treinar iniciantes mesmo depois de trabalhar 10 horas.

Pessoas que viajam uma hora de metro para dar um treino de uma hora em meia, do outro lado da cidade, só por que o lugar é mais centralizado para todo mundo.

Valorizem as pessoas certas. 

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